‘Comunicação Não Violenta’, de Marshall Rosenberg

Diagrama da Comunicação Não Violenta. Bhuston at English Wikipedia, CC BY 3.0, via Wikimedia Commons.
Diagrama da Comunicação Não Violenta. Bhuston at English Wikipedia, CC BY 3.0, via Wikimedia Commons.

Em épocas de extrema polarização e guerras, aqueles que valorizam a paz se voltam a iniciativas e métodos que já tiveram eficácia, a fim de testar se podem ser adaptados ao tempo em que vivem. Um destes métodos é a Comunicação Não Violenta, desenvolvida por Marshall Rosenberg.

Marshall Bertram Rosenberg (1934–2015) foi um Ph. D. em Psicologia Clínica estadunidense que teve como mentor Carl Rogers (1902–1987), o desenvolvedor da Terapia Centrada na Pessoa.

Rosenberg trabalhou como orientador educacional mediando conflitos na turbulenta época em que as escolas abandonavam o modelo segregacionista e também entrou em sintonia com o movimento dos direitos civis nos anos sessenta, nos EUA. Mais tarde viria a atuar internacionalmente como mediador e pacificador, fornecendo treinamento a milhares de pessoas em mais de sessenta países. [1]

O processo recebe o nome de Comunicação Não Violenta no sentido em que Gandhi deu à expressão “não violência”: um estado compassivo natural que surge quando a violência se apazigua no coração. Pode ser aplicado a conflitos pessoais, profissionais, sociais e, em escala maior, na mediação de conflitos entre povos.

A melhor introdução à Comunicação Não Violenta talvez seja ler o texto do próprio autor, que “impressiona pela profundidade do trabalho e pela simplicidade das soluções”, como diz Arun Gandhi, neto de Mahatma Gandhi (1869–1948), no prefácio da versão de 2003 do livro. [2]

Marshall expõe que, desde cedo, aprendemos a nos comunicar de forma alienante — em termos de “o que está errado com os outros?” ou “quem merece o quê?” –, e nosso foco foi treinado, portanto, em detectar níveis de erros nos outros e em nós mesmos, aplicando rótulos, comparações, críticas, culpas, humilhações, insultos… Queremos classificar quem é bom, quem é mal, normal, anormal etc. Rosenberg observa, porém, que nossas análises sobre os outros, são, na verdade, expressões de nossas próprias necessidades e valores.

Entre as primeiras formas de comunicação alienante exemplificadas no texto, estão os juízos ou julgamentos moralistas. O autor faz a distinção entre julgamentos de valor e julgamentos moralistas, talvez algo que já tenhamos ouvido desde a escola básica, mas que podemos ter dificuldade em discernir. Marshall relaciona os julgamentos de valor às qualidades que valorizamos na vida, como paz e liberdade; eles refletem nossas crenças sobre como servir melhor à vida. E os julgamentos moralistas são os que relacionamos a pessoas que não se harmonizam com nossos julgamentos de valor, considerando-as erradas ou más. [3]

No prefácio, Arun Gandhi diz que seu avô o ensinou a localizar no mundo a violência passiva, ou emocional, que seria mais insidiosa que a violência física, por ser seu combustível. “Como podemos extinguir um incêndio sem cortar o combustível que inicia o inferno?” [4]

Já a comunicação não violenta de Marshall Rosenberg é um treinamento com foco em esclarecer o que está sendo observado, sentido e desejado, em vez de diagnosticar e julgar. Para o autor, é preciso superar as formas de comunicação alienante da vida, que nos aprisionam em um mundo de ideias sobre o que é certo e o que é errado, um mundo de julgamento, cuja preocupação está viciada em saber “quem é o quê”. Marshall cita uma frase do poeta sufi Rumi (1207–1273): “Para além das ideias sobre o que é errado e o que é certo, existe um campo. Eu me encontrarei com você lá.” [5]

Outra forma de comunicação alienante é a negação de responsabilidade. Rosenberg cita o estudo de Hannah Arendt sobre a banalidade do mal. O oficial nazista Adolf Eichmann, questionado sobre seus crimes, relatou que ele e os demais oficiais tinham sua própria linguagem de negação de responsabilidade, um “burocratês”, usando frases como: “Eu tive que…”. Se perguntados “Por que tiveram que…?”, respondiam com: “Ordens superiores.”, “Era a lei.” etc. Marshall argumenta que a linguagem alienante obscurece a consciência de responsabilidade pessoal; a consciência de que, cada um de nós é responsável pelo que pensa, sente e faz. [6]

É possível assistir ao próprio Marshall Rosenberg em ação neste vídeo com legendas em português (47 minutos) ou nos vídeos do canal do CNVC, no YouTube. [7]

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[1] ‘Albuquerque Journal’. 14 fev. 2015. Consultado em: 22 mar. 2015. ‘Apud’ Wikipedia em português: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Marshall_Rosenberg>. Consultada em: 16 mar. 2024.

[2] ‘Nonviolent communication: a language of life’. 2. ed. Encinitas [California], PuddleDancer Press, 2003, p. XIV [prefácio de Arund Gandhi]. Disponível em: <https://archive.org/details/isbn_9781892005038>. Acesso em: 16 mar 2024.

[3] Id. ibid., p. 17.

[4] Id. ibid., p. XIV, tradução livre nossa.

[5] Id. ibid., p. 15. Tradução livre nossa.

[6] Id. ibid., p. 19 et seq. O estudo a que se refere o autor é o livro ‘Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal’, de Hannah Arendt.

[7] Para vídeos em língua estrangeira, veja como acessar legendas automáticas em português em nosso post anterior, sobre ‘A Montanha Mágica’, de Thomas Mann.

Fonte da imagem:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:The_Inner_World_of_OFNR_(NVC).png
Bhuston at English Wikipedia, CC BY 3.0 https://creativecommons.org/licenses/by/3.0, via Wikimedia Commons

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Kari Shea karishea, CC0, via Wikimedia Commons
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