‘Sociedade contemporânea e desenvolvimento sustentável’, um livro de Cynthia Roncaglio e Nadja Janke

Desenvolvimento sustentável. Favela Kibagare em Nairóbi, Quênia.
Favela Kibagare em Nairóbi, Quênia, Ninara, CC BY 2.0, via Wikimedia Commons.

O desenvolvimento sustentável é uma das principais condições para obter e manter a paz no mundo. A promoção de uma paz duradoura e o desenvolvimento sustentável, inclusive, têm sido entendidos como elementos complementares. [1]

Em 1987, no relatório Brundtland, a Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Unced) assim definiu ‘desenvolvimento sustentável’: “é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”. [2]

Com 234 páginas, este manual de Cynthia Roncaglio e Nadja Janke é bastante completo para quem deseja se atualizar e compreender as questões relativas ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável — e à paz mundial — nas sociedades moderna e pós-moderna.

Nos capítulos iniciais, Cynthia Roncaglio faz um percurso sucinto e esclarecedor pela história e as teorias sociais — clássica e contemporânea — acompanhando a evolução do pensamento sobre a relação da sociedade com a natureza. René Descartes, Immanuel Kant, Benjamin Constant, Karl Marx, Émile Durkheim, Max Weber, Eric Hobsbawm, Sérgio Paulo Rouanet, Anthony Giddens, Ulrich Beck, Jürgen Habermas, Edgar Morin, Ignacy Sachs, Michel Serres e Alain Touraine, entre outros, são alguns dos pensadores comentados pela autora.

Inicialmente, destaque é dado ao debate sobre o modelo civilizatório do Iluminismo, seus valores, conforme se apresentaram e se transformaram, na Ilustração, no liberalismo, no socialismo e no capitalismo. E como suas promessas de emancipação do homem e progresso ilimitado colapsaram. De acordo com Rouanet, “o universalismo foi sabotado pelos particularismos — nacionais, raciais, culturais, religiosos” [3]. E o individualismo, no sentido de existência concreta, desprendida do clã ou da tribo, “submerge cada vez mais no anonimato do conformismo e da sociedade de consumo”. [4]

Cynthia Roncaglio relata o processo histórico de degradação ambiental pela industrialização tanto no sistema de produção capitalista quanto no socialista, com economia de mercado ou de planejamento central. A autora expõe como as mudanças sociais e econômicas no século XX solaparam tanto a ideia cartesiana de que o homem é o senhor da natureza (século XVII) quanto a ideologia de progresso e o entusiasmo dos anos dourados (entre 1947 e 1973).

De fato, tais mudanças corresponderam à degradação do ambiente e não solucionaram os problemas da desigualdade social e da fome em um mundo onde mais de um bilhão de pessoas vive em pobreza multidimensional aguda. [5]

Ulrich Beck, autor citado no livro, distingue três fases históricas de desenvolvimento social:

  • as sociedades pré-industriais ou pré-modernas, inseguras, em que os perigos naturais ou externos são considerados inevitáveis e suas explicações são divinas;
  • as sociedades industriais clássicas, em que os perigos são percebidos como derivados da ação de indivíduos ou de forças sociais; criam-se instituições para partilhar os riscos, propondo responsabilidades coletivas;
  • as sociedades contemporâneas, ou sociedades de risco, em que os perigos não são passíveis de ser determinados porque extrapolam os espaços nacionais, afetando todo o planeta. [6]

Segundo Roncaglio, de modo geral:

“Tanto Giddens e Beck como Habermas entendem que a base democrática deve sustentar a reafirmação do poder político sobre o poder econômico, das normas éticas e culturais sobre os imperativos do sistema, para que se possa encontrar uma resposta adequada e justa para o problema da degradação ambiental.” [7]

O livro também contém explicação e debate da terminologia e das expressões essenciais sobre o tema: ecologia, meio ambiente, desenvolvimento sustentável, pós-modernidade, mal-estar da civilização, sociedade de consumo, sociedade de risco e globalização, entre outros.

A palavra ‘globalização’ tem sido usada para explicar mudanças e crises no mundo desde as últimas décadas do século XX, com várias conotações, geralmente enfocando a mundialização da economia e as inovações tecnológicas.

As autoras aprofundam o debate sobre o termo e citam vários autores. Um deles é Alain Touraine, que considera a globalização “uma ideologia que mascara as relações de dominação econômicas introduzindo a imagem de um conjunto econômico mundial autorregulado ou fora de alcance da intervenção dos centros de decisão políticos.” [8]

Touraine também denuncia…

“uma degradação dupla: da atividade econômica, que deixou de unir técnicas, relações sociais de produção e mercado e reduz-se a um mercado internacionalizado; e a degradação das identidades culturais, que servem para legitimar poderes autoritários. A perversão é a economia reduzida ao mercado e as culturas utilizadas como ideologias.
[…] Poderemos fugir da escolha entre duas soluções igualmente destruidoras, a saber, viver juntos pondo de lado nossas diferenças, ou viver separadamente em comunidades homogêneas que só se comunicarão pelo mercado e pela violência?” [9]

As autoras prosseguem, unindo os conceitos e as teorias às ações, com análises de propostas, diretrizes, políticas públicas e experiências de desenvolvimento sustentável no Brasil e no mundo.

– – –

A seguir um trecho do Sumário:

Teoria social e ambiente I
Teoria social e ambiente II
Modernidade, racionalidade e ordem
Pós-modernidade, irracionalidade e desordem
Desenvolvimento sustentável
Sustentabilidade para quem?
Políticas públicas e desenvolvimento sustentável
Estado e ambiente no Brasil
Sociedade e ambiente no Brasil
Ambiente urbano e desenvolvimento sustentável I
Ambiente urbano e desenvolvimento sustentável II
Ambiente rural e desenvolvimento sustentável I
Ambiente rural e desenvolvimento sustentável II
Cuidando da natureza
Saberes em jogo na qualidade ambiental
Gestão participativa e ambiente
Ações ambientais globais
Experiências de ações ambientais nas políticas públicas locais
Experiências de ações ambientais envolvendo participação popular e cidadania
Experiências de ações ambientais nas empresas privadas
Educação Ambiental como instrumento de superação da insustentabilidade
Educação Ambiental em perspectiva

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[1] WÄHLISCH, Martin. Parameters of Sustainable Peace: UN Frameworks and Practice. In: CARSTEN, Stahn et JENS, Iverson (Eds.). ‘Just Peace After Conflict: Jus Post Bellum and the Justice of Peace’. Oxford, Oxford University Press, 2020. Disponível em: <https://academic.oup.com/book/39643/chapter/339610081>. Acesso em: 17 jul 2024.

[2] RONCAGLIO, Cynthia et JANKE, Nadja. ‘Sociedade contemporânea e desenvolvimento sustentável’. 1.ed., rev. Curitiba, IESDE, 2012, p. 52-53.

[3] ROUANET, Sérgio Paulo. ‘Mal-Estar na Modernidade’. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 97 ‘apud’ RONCAGLIO, op. cit., p. 36.

[4] RONCAGLIO, op. cit., p. 36.

[5] PNUD. 25 países reduziram pela metade a pobreza multidimensional em 15 anos, mas 1,1 bilhão ainda vive na pobreza, 11 de julho de 2023. Disponível em: <https://www.undp.org/pt/brazil/press-releases/25-paises-reduziram-pela-metade-pobreza-multidimensional-em-15-anos-mas-11-bilhao-ainda-vive-na-pobreza>. Acesso em: 17 jul 2024.

[6] RONCAGLIO, op. cit., p. 22-23.

[7] Ibid., p. 25.

[8] TOURAINE, Alain. ‘Poderemos Viver Juntos?’ Petrópolis: Vozes, 1999, p. 40 ‘apud’ RONCAGLIO, op. cit., p. 43.

[9] TOURAINE, Alain. op. cit, p. 47; p. 63 ‘apud’ RONCAGLIO, op. cit., p. 43.

Fonte da imagem:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Kibagare_Slum_in_Nairobi,_Kanya_(52566396593).jpg
Ninara, CC BY 2.0 https://creativecommons.org/licenses/by/2.0, via Wikimedia Commons

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Kari Shea karishea, CC0, via Wikimedia Commons
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